Caetano Veloso: pura referência

Caetano Veloso jogou várias influências em seu liquidificador sonoro para criar Prenda Minha. No novo disco, lançado pela PolyGram, o artista escolheu apenas as canções do show Livro Vivo que não estavam incluídas no disco Livro, seu último trabalho em estúdio. Gravado em setembro no Metropolitan, no Rio, o álbum traz um trecho recitado do livro Verdade Tropical, novas versões para músicas demasiadamente gravadas – Terra e Odara -, um toque de Fina Estampa com a releitura em espanhol para Mel e ainda uma interpretação de Prenda Minha, pérola anônima do folclore gaúcho que desvenda as intenções de Caetano: homenagear, citar e lembrar influências.

A faixa-título do novo CD foi gravada em 1962 por Miles Davis e Gil Evans no bossa-novístico LP Quiet Nights, batizada de Song Number 2, e que um dos maiores trompetista de todos os tempos não teve pudores em afirmar que era o autor. Com a voz substituindo o trompete, Caetano canta com sotaque gaúcho caricaturado e, num arranjo que lembra a canção que abre o álbum americano, busca “devolver” a música ao domínio público. Pretensões à parte, a linha que realmente conduz o novo CD são as homenagens a vários artistas: Jorge Benjor, com Jorge de Capadócia, que Caetano havia gravado em 1975, Tom Jobim, com Meditação, Chico Buarque, com Carolina, e Peninha, o brega preferido do cantor, com Sozinho. Sem deixar de cair no lugar-comum ao venerar João Gilberto com Saudosismo, Caetano escancara a admiração por Gilberto Gil.

Além de recitar o trecho de seu livro Verdade Tropical em que lembra como a sua mãe – Dona Canô – referia-se a Gilberto Gil, o cantor resgata a inédita Bem Devagar, que Gil compôs na adolescência, e Drão, numa versão acústica de arrepiar. Maria Bethânia também ganha um afago. Caetano presta homenagem à irmã com duas músicas que ainda não havia interpretado: Esse Cara – que ganhou arranjo belíssimo – e Mel, parceria dele com Wally Salomão, cantada em ritmo de rumba e com letra em espanhol de Willie Cólon. Outra que Caetano nunca tinha gravado é o funk Linha do Equador, parceria dele com Djavan.

No entanto, o contra-senso é que a sonoridade do novo CD é baseada no anterior, que serve de base para o espetáculo que resultou no novo trabalho. Os arranjos de metais e cordas ao estilo Gil Evans e uma percussão com forte sotaque baiano estão presentes, embora o repertório de Livro não apareça. Apesar de deixar claro que ainda passa por um momento de pouca inspiração desde o lançamento de Livro, disco que Caetano reconhece ter feito “nas coxas”, o compositor prova sua genialidade como intérprete e que finalmente atingiu o ápice como cantor.

* Publicado em 24/11 /98 pela Cult Press/Carta Z Notícias

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